À MESA DE JANTAR
(Pticha, parágrafos 15 e 16)

Primeiro Ato.

Numa casa brilhantemente iluminada, com salas amplas, um homem de aparência agradável está ocupado na cozinha. Ele está preparando uma refeição para um convidado longamente esperado. Enquanto vagueia entre pratos e panelas, ele se lembra das iguarias que o seu convidado mais gosta. É claro que ele espera alegremente. Com movimentos de dança ele põe cinco travessas na mesa. Perto da mesa há duas cadeiras estofadas.

Uma batida na porta, e o convidado entra. O rosto do anfitrião se ilumina ao ver o convidado, e ele o convida para sentar à mesa. O convidado senta-se e o anfitrião olha para ele carinhosamente. O convidado olha para as iguarias à sua frente e as cheira, de uma distância respeitosa. Fica claro que o convidado gosta do que está vendo, mas expressa sua admiração com uma reserva discreta, não deixando transparecer que ele sabe que a comida foi preparada para ele.

Anfitrião: Sente-se, por favor, eu preparei todas essas coisas especialmente para você porque eu sei o quanto você gosta delas, em especial. Nós dois sabemos que eu conheço aquilo de que você mais gosta. Eu sei que você está com fome, e o quanto você pode comer, então eu preparei tudo exatamente do jeito que você prefere, exatamente na quantidade que você pode comer sem deixar nem uma migalha.

Narrador: Se sobrasse alguma comida depois que o convidado se saciasse, ambos, o anfitrião e o convidado, ficariam infelizes. O anfitrião ficaria infeliz porque isso significaria que ele deseja doar ao seu convidado mais do que o convidado deseja receber, e o convidado ficaria desapontado por não ser capaz de satisfazer o desejo do anfitrião de que ele consuma tudo. O convidado também lamentaria, se ele se sentisse já preenchido, enquanto há mais iguarias, mas não há mais espaço em seu estômago para aproveitar isso. Isso significaria que não há uma quantidade suficiente de desejo pelo prazer.

Convidado (solenemente): De fato você preparou exatamente o que eu gostaria de ver e comer na minha mesa de jantar. Até a quantidade está precisa. Isso é tudo o que eu esperava saborear na vida. Se eu conseguisse tudo isso eu provavelmente receberia o máximo prazer divino.

Anfitrião: Então, aproveite tudo e assim, me delicie.

O convidado começa a comer.

Convidado (obviamente apreciando tudo e com a boca cheia, ainda que pareça um pouco preocupado): Por que acontece isso, que quanto mais eu coma, menos eu goste da comida? O prazer que eu consigo afasta a fome e eu gosto disso cada vez menos. Quanto mais perto eu chego de me sentir completo, menos eu gosto da minha refeição. E quando eu recebo todo o alimento, não me resta nada mais que a lembrança do prazer, e não o próprio prazer. O prazer acontecia somente enquanto eu estava com fome. Quando a fome desapareceu, sumiu também a alegria. Eu recebi aquilo que eu desejava tanto e agora estou sem prazer nem alegria. Eu não quero mais nada e não há nada que me traga alegria.

Anfitrião (um pouco ressentido): Eu fiz tudo o que eu podia para te alegrar. Não é minha culpa que a própria recepção do prazer acabe com a sensação de delícia porque a vontade vai embora. De qualquer modo, você agora está pleno daquilo que eu preparei para você.

Convidado (se defendendo): Recebendo tudo o que você preparou para mim, eu não consigo nem mesmo te agradecer, porque eu parei de sentir alegria com a abundância que você me deu. O principal é que eu sinto que você me deu algo, e eu não tenho nada para dar em troca. Assim, o resultado é que você me fez sentir vergonha, manifestando inadvertidamente que você é o doador e eu sou o tomador.

Anfitrião: Eu não mostrei a você que você é o receptor e eu sou o doador. Mas de fato eu queria que você recebesse alguma coisa, sem te causar o sentimento do que você estava recebendo de mim, porque a bondade é minha natureza e eu não quero mais do que a sua aceitação da comida. Eu não posso mudar isso. Por exemplo, eu crio peixes. Eles não se importam com quem lhes dá comida e os alimenta... Eu também tomo conta do meu gato; ele também não se importa com de quem é a mão que o alimenta. Mas Rex, o meu cachorro, realmente se importa, e não aceitaria comida de qualquer um. As pessoas são feitas de um modo que algumas, recebem sem sentir que alguém está doando, e simplesmente tomam. Algumas até são capazes de roubar sem remorso! Mas se uma pessoa tem um sentido desenvolvido do próprio ser, ela sente o doador e isso desperta nela a consciência de que ela é a tomadora. Isso produz vergonha, auto-recriminação e agonia.

Convidado (um pouco tranqüilizado): Mas o que eu posso fazer para receber prazer por um lado, e por outro, não me perceber como tomador? Como eu posso neutralizar o sentimento interior de que você é o doador e eu sou o tomador? Se há uma situação de doar e tomar e isso me envergonha, o que eu posso fazer para evitar? Talvez você possa agir de um modo que eu não me sinta como o receptor! Mas isso só será possível se eu não souber da sua existência (assim como um peixe), ou se eu sentir que você existe, mas não compreender que você está me doando (assim como o gato ou um ser humano não desenvolvido).

Anfitrião (apertando os olhos com concentração e falando cuidadosamente): Eu acho que no fim das contas, há uma solução. Talvez você possa fazer algo em você mesmo que neutralize a sua sensação de recepção!

Convidado (os olhos brilhando): Ah, entendi! Você sempre quis que eu fosse seu convidado. Assim, amanhã, eu virei aqui e vou desempenhar a recepção de um modo que faça você se sentir não mais como o doador, mas como o receptor. Eu ainda serei o receptor, é claro, comendo tudo o que você preparou, mas eu vou perceber a mim mesmo como o doador.

Segundo Ato

No dia seguinte, na mesma sala, o anfitrião preparou uma refeição fresca com exatamente as mesmas iguarias do dia anterior. Ele senta-se à mesa e o convidado entra, ostentando uma nova expressão em seu rosto, como se soubesse um segredo.

Anfitrião (sorrindo brilhantemente, desapercebido da mudança): Eu estava esperando você. Eu estou tão feliz de te ver, sente-se.

O convidado senta-se à mesa e polidamente sente o aroma da comida.

Convidado (olhando para a comida): Isso tudo é para mim?

Anfitrião: Mas é claro! Só para você! Eu ficaria muito feliz se você aceitasse receber tudo isso de mim.

Convidado: Eu não quero isso tudo tanto assim.

Anfitrião: Mas isso não é verdade! Eu sei muito bem que você quer isso tudo! Por que você não aceita?

Convidado: Eu não posso receber tudo isso de você. Isso me faz sentir desconfortável.

Anfitrião: Como assim, desconfortável? Eu quero tanto que você aceite isso tudo! Para quem você acha que eu preparei isso tudo? Você me daria tanto prazer se comesse tudo...

Convidado: Talvez você tenha razão, mas eu não quero receber esses pratos!

Anfitrião: Mas na verdade você não está recebendo uma refeição, você está me fazendo um favor sentando à minha mesa e aproveitando tudo o que eu preparei. Afinal, eu não preparei tudo isso para você, mas porque eu me alegro tanto com a sua recepção do que vem de mim. É por isso que o seu consentimento em comer não seria recepção da sua parte, mas sim, um favor que você me faz. Você estaria recebendo isso tudo de mim! Não seria como tomar, da sua parte, mas sim, eu que estaria obtendo uma grande alegria da sua parte. Você é o único que está doando a mim, e não o contrário.

O proprietário estende suplicantemente o prato cheiroso diante de seu convidado relutante. O convidado rejeita. O proprietário oferece o prato novamente, e o convidado o rejeita novamente. O proprietário suspira e toda a sua aparência traduz seu desejo de que o convidado aceite a comida. O convidado assume a postura do doador que está fazendo um favor ao anfitrião.

Anfitrião: Eu imploro, faça-me feliz!

O convidado começa a comer, e então pára, para pensar. Então começa novamente, e outra vez, ele pára. A cada vez que o convidado pára, o anfitrião o encoraja a continuar. Somente após alguma persuasão o convidado continua. O anfitrião prossegue empurrando novas iguarias à frente de seu convidado, a cada vez, suplicando que o convidado lhe dê o prazer de aceitá-las.

Convidado: Se eu puder ter certeza de que eu estou comendo porque isso te dá prazer, e não porque eu quero isto, então você se torna o receptor e eu me torno aquele que te dá prazer. Mas para isso eu preciso ter certeza que estou comendo somente por sua causa, e não por minha causa.

Anfitrião: Mas é claro que você está comendo apenas por minha causa. Afinal, você sentou à mesa e não queria experimentar nada até que eu provasse a você que você não estava apenas comendo, mas sim, dando-me uma grande alegria. Você veio aqui para me dar prazer.

Convidado: Mas se eu aceitasse alguma coisa pela qual eu não tivesse um desejo inicial, mas que você apenas tivesse me oferecido como algo para aceitar, eu não teria alegria em receber, e você não teria a alegria de me ver desejando aceitar sua oferta. Resulta que você somente pode receber prazer na medida em que eu aprecio a sua oferta.

Anfitrião: Eu sei exatamente o quanto você gosta dessa comida, o quanto você pode comer de cada prato, e foi de acordo com isso que eu preparei essas cinco travessas. Afinal, eu conheço o seu desejo por isso e somente por isso, em vez de outra coisa na sua vida. O conhecimento do quanto você gosta disso evoca a sensação do seu prazer em mim. Produz-se um prazer em mim, que você goste dos meus pratos. Eu não tenho dúvida de que o prazer que eu obtenho de você tem um bom fundamento.

Convidado: Como eu posso ter certeza de que eu estou aproveitando isto somente porque você quer que eu faça assim, e porque você preparou tudo isto para mim? Como eu posso ter certeza de que eu não vou deixar você, e de que recebendo de você, na verdade, eu estarei te dando alegria?

Anfitrião: É muito simples! Porque você recusou completamente minhas ofertas, e somente após você ter certeza de que estava fazendo isso por mim, é que você começou a aceitar. A cada pedaço que você come, você sente que está fazendo isso por mim, você sente a alegria que você está me dando.

Convidado: Se eu pensar a cada vez que eu recebo, que eu estou fazendo isso por você, eu não me recusaria a receber, e se eu atingir a intenção de fazer isso por você, enquanto recebo de você, eu vou me livrar da vergonha e ter orgulho em te dar prazer.

Anfitrião: Então coma tudo! Você quer isso tudo, então você vai me dar cada porção de prazer que você puder!

Convidado (come com prazer até o último prato, mas então, sentindo-se novamente insatisfeito): Então, agora eu comi tudo e gostei. Não há mais comida para saborear. Meu prazer foi embora porque eu não estou mais com fome. Eu não posso mais contentar a nenhum de nós dois. Então o que eu devo fazer, agora?

Anfitrião: Eu não sei. Você me deu um enorme prazer recebendo de mim. O que mais eu posso fazer por você, para que você tenha essa alegria outra vez, e outra? Como você pode querer comer novamente, se você já tiver comido tudo? Onde você vai encontrar um novo apetite?

Convidado: É verdade, meu desejo pela alegria tornou-se um desejo de doar a você, e se agora eu não posso mais sentir alegria, como eu posso te proporcionar prazer? Afinal, eu não posso criar em mim mesmo um apetite por outra refeição de cinco travessas.

Anfitrião: Eu também não preparei nada mais além do que você desejava. Eu doei tudo que podia. Seu problema é: “Como eu posso não deixar de querer mais, enquanto eu recebo”.

Convidado: Mas se o prazer não satisfaz a fome, ele não é sentido como prazer. A sensação de prazer vem da satisfação da necessidade. Se eu não estivesse faminto, eu não poderia aproveitar a comida e por isso, não poderia doar a você. O que eu posso fazer para permanecer em desejo constante, e constantemente dar alegria a você, recebendo um novo prazer?

Anfitrião: Para isso você precisa de uma fonte diferente de desejos, e de meios diferentes de satisfação. Usando a sua fome pela comida e alegria que vem da comida, você eliminou as duas.

Convidado: Eu percebi isto! O problema é que eu me proíbo de sentir alegria se eu sentir você como o beneficente. Eu recusei a tal ponto, que a refeição inteira ficou à minha frente, sem que eu pudesse aceitar, por causa da vergonha. Essa vergonha era tão intensa que eu preferia morrer de fome, para evitar o sentimento de vergonha de ser o receptor.

Anfitrião: Mas então, uma vez que você se convenceu de que não estava recebendo para si mesmo, você começou a receber por minha causa. Por causa disso você pôde aproveitar tanto a comida quanto o prazer que você estava me dando. É por isso que a comida precisa ser de acordo com o seu desejo. Afinal, se não fosse o prazer vindo da comida, que prazer você poderia me dar?

Convidado: Mas não é o suficiente receber de você, sabendo que você me aprecia. Se meu prazer vem da sua alegria, então a fonte de meu prazer não é a comida, mas você! Eu preciso sentir a sua alegria.

Anfitrião: Eu estou completamente aberto para isso.

Convidado: Sim, mas do que depende o meu prazer? Depende de você, aquele a quem eu estou dando prazer. Isso significa que meu prazer depende da extensão de meu desejo de doar a você; isto é, da extensão em que eu sinta a sua grandeza.

Anfitrião: Então, o que eu posso fazer?

Convidado: Se eu soubesse um pouco mais sobre você, se eu tivesse um conhecimento mais íntimo de você, de que você é realmente grande, então sua grandeza e onipotência teriam sido reveladas a mim. Então eu teria alegria não somente em te dar prazer, mas também, eu teria consciência de a quem eu estou dando prazer. Então, meu prazer seria proporcional à revelação de sua grandeza.

Anfitrião: E isso depende de mim?

Convidado: Veja, se eu dôo, é importante para mim saber quanto eu estou dando, e para quem. Se isso é para pessoas amadas, por exemplo, meus filhos, então eu vou querer doar na medida de meu amor por eles, porque assim eu mesmo me alegro. Mas se alguém da rua vem à minha casa, eu quero doar algo a essa pessoa somente por simpatia, porque eu sinto a agonia de outra pessoa, ou porque eu espero que quando eu enfrentar necessidade eu serei ajudado da mesma forma.

Anfitrião: É esse princípio que sustenta todo o conceito de bem-estar social. As pessoas imaginam que se não houvesse assistência mútua elas todas iriam sofrer, que elas sofreriam elas mesmas, quando se tornassem os necessitados. O egoísmo força o homem a doar, mas isso não é uma doação verdadeira. Isso é simplesmente o homem garantindo o seu futuro.

Convidado: Eu acho que essa espécie de doação não pode nem ser levada em conta. Toda a nossa generosidade não é mais do que uma recepção camuflada. A satisfação de si mesmo por agradar aos outros.

Anfitrião: Então como eu posso te dar prazer além do prazer encontrado na comida?

Convidado: Isso não depende de você, mas de mim. Se a pessoa que vem à minha casa não for uma pessoa comum, mas uma personalidade importante, eu receberia um prazer maior em dar a ela, mais do que a uma pessoa comum. Isso significa que o prazer não depende da comida, mas de quem a preparou!

Anfitrião: Então, o que eu posso fazer para você me respeitar mais?

Convidado: Porque eu recebo, não para o meu benefício, mas para o seu, e então eu estou doando a você, quanto mais respeito eu tenha por você, mais prazer eu terei, sabendo a quem eu estou doando.

Anfitrião: Então como eu posso aprofundar sua estima por mim?

Convidado: Conte-me mais sobre você mesmo, mostre-me quem você é! Então eu poderei obter prazer não apenas recebendo a comida, mas também, sabendo quem está dando isso para mim, sabendo com quem eu tenho uma relação. A menor porção de comida recebida de uma grande pessoa dará uma quantidade muito maior de prazer. O prazer cresce na medida do quão grande eu considere você.

Anfitrião: Isso significa que para o prazer tornar-se grande eu preciso me abrir para você e você precisa desenvolver uma semelhança comigo em você.

Convidado: Exatamente! É isso que criará uma nova fome em mim – o desejo de doar a você cresce em proporção à sua grandeza, e não porque eu quero escapar da sensação de vergonha, porque a vergonha não me levará a satisfazer minha fome.

Anfitrião: Desse modo você começa a sentir não a fome, mas a minha grandeza, e deseja dar-me prazer. E desse modo você começará a satisfazer não o apetite, pois não é isso que traz você a mim, mas minha grandeza e o desejo de me agradar?

Convidado: E o que há de errado nisso? Eu posso receber prazer vindo da comida muitas vezes mais do que a própria comida pode dar, porque eu adiciono à fome um segundo desejo – o desejo de doar a você.

Anfitrião: Também esse desejo eu posso satisfazer.

Convidado: Não, esse desejo e sua satisfação eu crio em mim mesmo. Para isso, eu preciso apenas conhecer você. Revele-se a mim e eu criarei em mim um anseio por doar a você, e receberei prazer de doar, e não da eliminação da vergonha.

Anfitrião: O que você ganhará com isso, além do fato de que seu prazer vai aumentar?

Convidado (dando a entender claramente que este é o objetivo de tudo): Há outro ganho maior: Se eu crio em mim um novo desejo, além da fome inerente, eu me torno o mestre desse desejo. Eu posso sempre aumenta-lo, e sempre satisfaze-lo com prazer, e sempre doar a você, recebendo prazer.

Anfitrião: Essa satisfação não fará o desejo desaparecer, assim como a fome?

Convidado: Não, porque eu sempre poderei criar em mim uma impressão maior de você. Novos desejos de doar irão surgir constantemente, e recebendo de você eu poderei abranger esses desejos. Esse processo pode prosseguir infinitamente.

Anfitrião: Do que isso depende?

Convidado: Depende da constante descoberta de novas virtudes e de sua grandeza.

Anfitrião: Isso significa que, por constante auto-indulgência, mesmo que recebendo prazer egoísta, a fome não vai cessar, mas ao contrário, aumentar por essa recepção, a criação de uma nova fome pode ser formada: o desejo de sentir o doador.

Convidado: Sim, adicionalmente à recepção do prazer (as iguarias), um senso da grandeza do doador se desenvolve. A descoberta do anfitrião e as iguarias tornam-se o mesmo. Porque o próprio prazer cria uma consciência do doador, e o doador, a comida e os atributos do doador são um e o mesmo.

Anfitrião: Então, primeiro, o que você queria, subconscientemente, era a revelação do doador. Para você, isso e mais nada, é uma satisfação.

Convidado: No início eu nem mesmo entendia que esse era o meu desejo. Eu somente via a comida e pensava que isso era o que eu queria.

Anfitrião: Eu fiz de propósito! Assim gradualmente você desenvolveria seu próprio desejo independente, que você supostamente criaria em você mesmo, de um modo que você mesmo pudesse satisfazê-lo. Isso significaria que você está assumindo o lugar de ambos, o anfitrião e o convidado, simultaneamente.

Convidado: Por que isso tudo é construído dessa forma?

Anfitrião: Para trazer você à plenitude. Assim você pode desejar cada coisa em sua totalidade e atingirá a máxima satisfação. E assim você aproveitará cada desejo e o prazer não terá nenhuma limitação.

Convidado: Então porque eu não soube disso desde o começo? Afinal, tudo o que eu vejo em volta são objetos que eu desejava, sem suspeitar que o que eu realmente desejava todo o tempo era você.

Anfitrião: Isso foi feito precisamente para que, a partir de uma situação em que você não estava me sentindo, você poderia vir a mim por você mesmo e criaria esse desejo interno.

Convidado (maravilhado): Mas se eu criei esse desejo em mim, onde está você nesse quadro?

Anfitrião: Fui eu que criei o simples desejo egoísta em você, para começar. Eu o desenvolvi, cercando você constantemente com novos objetos de delícia.

Convidado: Mas para que tudo isso?

Anfitrião: Com o propósito de convencer você de que nenhuma busca de prazer satisfará você.

Convidado: Eu posso ver isto: no momento em que eu consigo o que eu quero, o prazer que isso me dá desaparece instantaneamente, e novamente eu desejo alguma coisa, ainda maior ou completamente diferente. Então eu estou numa constante busca de prazer, mas nunca atinjo isso, porque no minuto em que eu ponho minhas mãos sobre essa coisa, ela desaparece.

Anfitrião: Precisamente por esta razão você desenvolve o seu senso de si mesmo e atinge a consciência da futilidade desse tipo de existência.

Convidado: Enquanto você desenvolvia em mim um quadro do que acontecia, eu consegui entender o significado, o propósito de tudo o que estava acontecendo!

Anfitrião: Esse quadro é revelado assim que você se convence inteiramente da falta de propósito de sua existência egoísta, e torne-se consciente de que é necessária uma nova forma de conduta. Você precisa conhecer sua raiz e o significado de sua vida.

Convidado: Mas esse processo dura centenas de anos. Quando isso acaba?

Anfitrião: Nada é criado sem necessidade. Tudo o que existe, existe com o único propósito de trazer a criação ao conhecimento de uma forma diferente de existência. Esse processo é lento porque cada um dos pequenos desejos precisa desabrochar e ser reconhecido com desmerecedor do uso em sua forma original.

Convidado: E há muitos desses desejos?

Anfitrião: Uma quantidade enorme! Em proporção direta ao prazer que você receberá no futuro. Mas o prazer de receber comida não se modifica. Você pode fazer mais de uma refeição por dia. O volume de seu estômago não vai mudar. Assim, a soma do que vem de mim e é recebido por você não vai mudar. Mas jantando na minha mesa com o objetivo de me agradar, esse mesmo pensamento cria em você um novo desejo e um novo prazer, à parte do prazer da comida. Esse prazer é medido em tamanho e poder, ou seja, em quantidade e qualidade, de acordo com o total de prazer que você obtém jantando em minha mesa, com o propósito de me agradar.

Convidado: Então como eu posso aumentar meu desejo de receber prazer por sua causa?

Anfitrião: Isso depende de sua apreciação e respeito por mim. Em quão grande você considera que eu seja.

Convidado: Então como eu posso aumentar minha apreciação por você?

Anfitrião: Para isso você simplesmente precisa saber mais sobre mim. Precisa me enxergar em cada ação que eu produzo. Precisa observar e se convencer do quão grande realmente eu sou. Você precisa estar convencido de que eu sou todo-poderoso, misericordioso e bom.

Convidado: Então, mostre-se!

Anfitrião: Se o seu pedido vem de um desejo de doar para mim, eu irei me revelar. Mas se vem de um desejo de agradar a você mesmo, me vendo, eu não apenas pararei de me revelar a você, como vou me esconder ainda mais profundamente.

Convidado: Por que? Não é o mesmo para você, por qual meio eu receba de você? Afinal, você quer que eu tenha prazer. Por que se esconder de mim?

Anfitrião: Se eu me revelar inteiramente, você receberá tanto prazer na eternidade, poder absoluto e plenitude de mim, que não será mais capaz de aceitar esse prazer por minha causa. Esse pensamento não irá nem mesmo percorrer a sua mente e depois, você se sentirá envergonhado novamente. Além disso, já que o prazer será perpétuo, ele eliminará seu querer, e novamente você se verá esgotado de desejo.

Convidado (finalmente compreendendo): Então esse é o motivo de você se esconder de mim, é para me ajudar! E eu, por alguma razão, pensei que isso era porque você não queria que eu te conhecesse.

Anfitrião: Meu maior desejo é que você me veja e esteja perto de mim. Mas o que eu posso fazer se então, você não seria mais capaz de sentir prazer... Isso não seria o mesmo que morrer?

Convidado: Mas se eu não tiver consciência de você, como eu poderei fazer algum progresso? Isso tudo depende do quanto você se mostre a mim.

Anfitrião: De fato, somente o sentimento de minha presença cria em você a capacidade de crescer e receber. Sem esse sentido você apenas engoliria tudo e imediatamente deixaria de sentir qualquer prazer. É por isso que quando eu apareço para você, você sente vergonha, a sensação do doador, o desejo de receber os mesmos atributos do doador.

Convidado: Então, revele-se a mim tão logo seja possível.

Anfitrião: Eu vou, mas somente na medida em que você se beneficiará disso, embora eu sempre tenha querido me revelar a você. Afinal eu me escondi de propósito, para criar condições de livre escolha para você, para que você agisse e escolhesse como pensar independentemente da minha presença, e assim, não haveria nenhuma pressão por parte do anfitrião.

Convidado: Então como você se revela para mim?

Anfitrião: Eu faço isso lenta e gradualmente. Cada grau de revelação é chamado um Mundo, desde o degrau mais escondido, até o mais exposto.

Fim.